quarta-feira, 21 de abril de 2010

Sabedoria e cálculo do silêncio.

Vários ditados populares dão importância ao silêncio: “Deus nos deu uma boca e dois ouvidos para que possamos menos falar e mais ouvir”; “Manter a boca fechada e os olhos bem abertos”, diz uma versão italiana; “Em boca fechada não entra mosca”, dizem os espanhóis e portugueses. Os comerciantes europeus inventaram a metáfora “o silêncio é de ouro e palavra é de prata”. O provérbio árabe “cada palavra que tu falas é uma espada que te ameaças” induz a prudência e o cálculo sobre o que, como e em que ocasião falar.
Existe uma relação íntima entre o silêncio e a prudência. O padre jesuíta Baltazar Gracian (séc.17) achava que “no silêncio cauteloso é que a prudência se refugia”. Ou seja, escolher ficar em silêncio não é valorizar a mudez, mas sim, saber calar de acordo com o lugar ou a ocasião: “Fale pouco, mas nunca pareça mudo e embaraçado...”, dizia uma antiga etiqueta social. Até o filósofo da linguagem, Wittgenstein (séc. 20), alertava que “Aquilo que não se pode falar, deve-se calar”. Enfim, o silêncio pode ser reconhecido como uma virtude que evita polêmicas desnecessárias e brigas perigosas. “Diante de tanta ignorância respondo com meu silêncio”, encurtava Rui Barbosa.
Entretanto, diante da intolerância, do racismo e dos fundamentalismos, devemos ficar em silêncio? Nessas situações, o bom senso entende que “o dever do intelectual é romper o silêncio, ainda que sua voz seja abafada pelos poderosos e seus cúmplices de plantão”[1]. “O grande cúmplice da tirania é o silêncio; não atacar o despotismo é a maneira mais covarde de servi-lo; não denunciá-lo é auxiliá-lo; estar próximo dele sem feri-lo é a maneira mais vil de protegê-lo; e proteger o crime é mil vezes pior que cometê-lo; eis aí a hora em que a palavra é um dever e o silêncio é um crime”[2].
Nada justifica, portanto, que muitos intelectuais – principalmente aqueles que acreditam que a “esquerda deve ser, sempre, moral ou ética” fiquem calados diante do terrorismo (condenado, inclusive, por Che Guevara), do genocídio nos regimes totalitários autodenominados socialistas ou nacional-socialistas (nazi-fascistas), da corrupção, da delação em nome da “causa justa”. É triste reconhecer como o infantilismo ainda domina uma parte da esquerda que cultua personalidades e faz “turismo revolucionário”[3], se alienando de ver o “todo”. Há que sustentar, sempre, uma atitude crítica das contradições dos regimes ou dos homens “demasiadamente humanos”. Tomás de Aquino dizia temer o homem que só conhece um livro [Timeo hominem unius libri]. Os homens sensatos deveriam desconfiar de todos os discursos, sobretudo os que produzem entorpecimento da razão crítica dos ouvintes condenados a somente ouvir em silêncio, repetindo o que o “grande mestre” diz.Os alunos deveriam questionar os professores que falam tanto como que obrigando os alunos a um silêncio de fé. Provavelmente, nesse caso, não temos ensino, mas sim, doutrinação.
Hoje, convivemos com uma civilização complexa, dominada pelo fetiche tecnológico sem um código moral de como usar tais bugigangas. O celular, por exemplo, é útil, mas também pode ser um instrumento de incivilidade quando toca fora de hora e no lugar inadequado. Pior é quando o dono se acha no direito de atender, ali mesmo, sem cerimônia e sem vergonha, falando alto para quem quiser ouvir. E o que dizer daqueles que falam com o famigerado aparelho dirigindo seu carro? E os que rompem o silêncio imposto por uma prisão que serviria para fazerem seu exame de consciência e se sentem autorizados a usarem o aparelhinho para desencadear violência numa cidade como São Paulo?

[1] OZAI, Antonio. “Assim falou Vargas Vila”. Disponível em Revista Espaço Acadêmico, nº. 61, junho de 2006. Acesso em: jun. 2006. Acesso em: jun. 2006.

[2] BAZZO, Ezio Flavio. Assim falou Vargas Vila. Brasília: Companhia das Tetas Publicadora, 2005. (XLVIII).

[3] O psicanalista Contardo Calligaris toma emprestado uma idéia de outro psicanalista, Fábio Hermann, que observou que o “turista é quem tira seu retrato colocando-se na frente do lugar visitado, mas olhando para a câmera: somos turistas quando viajamos de costas para o real [...]. Aos turistas revolucionários de Caracas, sugiro uma leitura. Rossana Rossanda acaba de publicar (na Itália) suas memórias, "La Ragazza del Secolo Scorso" (a moça do século passado; Einaudi)”. (CALLIGARIS, C. Os revolucionários silenciosos. Folha de S. Paulo, Cad. Ilustrada, 22 de junho de 2006.

por: RAYMUNDO DE LIMA

Convenção do silêncio.

Burke observa que existe um “acordo público” que nos induz ficarmos em silêncio em certas ocasiões. Num velório, solenidade, audiência pública, culto religioso, concerto musical, durante a execução do Hino Nacional, o silêncio é sinal de respeito e sintonia espiritual. Devemos evitar falar, ainda que baixinho, para não causar constrangimentos em ambientes sociais necessariamente silenciosos. O silêncio é natural porque faz parte da função biológica, quando estamos num banheiro, tentando dormir; ou psicológica, quando nos entregamos à introspecção; ou social, quando esperamos nossa vez, numa fila, cortejo fúnebre.

O “silêncio é um dos elementos essenciais em todas as religiões”, observa G. Mensching. Há variedades de silêncio sagrado: pessoal, comunal, o ‘silêncio eleito’ dos monges e freiras de clausura, a oração silenciosa ou ‘mental’. “O silêncio religioso é um misto de respeito por uma divindade; uma técnica para abrir o ouvido interior; e um sentido de inadequação de palavras para descrever as realidades espirituais”, escreve P. Burke.

É preciso “saber ficar em silêncio”, sentenciava La Rochefoucault. Os mal educados ignoram o sentido ético, estético, cultural, moral, jurídico e psicológico do silêncio. Assim como o sábio e o monge escolhem ficar mais tempo em silêncio – meditando, orando – podemos inferir que os verdadeiramente civilizados e comprometidos com a sabedoria são propensos a conversas intercaladas com o silêncio da prudência ao dizer e esperar o outro revelar seu ponto de vista. O silêncio atua como parte fundamental de uma conversação, que deve obedecer às regras de diversas situações, revelando assim o grau de civilidade das pessoas que participam dos diferentes encontros sociais.

Existe o “silêncio localista” das igrejas, bibliotecas, museus e hospitais. Recebe um olhar de reprovação e um discreto psiu quem desrespeitar o silêncio necessário para rezar, estudar, apreciar, ouvir uma palestra, ou visitar um enfermo.
Portanto, precisa ser reeducado aquele que desrespeita os locais de silêncio. A pessoa que fala pelos cotovelos palavras vazias, que sofre de incontinência verbal monopolizando a palavra, poderia receber benefícios incalculáveis psicanálise. É preciso compreender que excesso de palavras cansa, irrita, chateia, e termina boicotando a harmonização do ambiente social e comprometendo a própria imagem do falante compulsivo.

Silêncio para ensinar.

Os professores do ensino fundamental e médio, atualmente, reclamam que na sala de aula passam mais tempo pedindo silêncio aos alunos do que ensinando. Apesar dos sinais de barbárie na escola contemporânea, pouco se tem feito para impedir o seu avanço. Que fazer se os especialistas em educação se limitam a rotina de produção teórica abstracionista, e os responsáveis pelo sistema educacional continuam fugindo do compromisso de fazer “dialética do concreto” com o cotidiano das relações humanas na escola e na universidade? Onde está o equilíbrio entre conhecimento e sabedoria na formação dos professores para o futuro? Quem educará os pais para melhor educar os filhos?
Um dos efeitos da “geração net” é não respeitar os espaços cujo silêncio é quase obrigatório. Além de não suportar o silêncio necessário para introspecção, a “geração net” não tem paciência de seguir o fio condutor de uma conversa. Quanto mais jovem, mais rapidamente passa de um tema para outro ou troca de interlocutor como quem aperta o botão do controle remoto da TV. Mais do que impaciência, tais atitudes podem também revelar intolerância e desrespeito para com o próximo e falta de sintonia com o ambiente.
Como imaginam que “mandam no pedaço”, crianças e adolescentes se acham no direito de interromper a conversa dos adultos por motivo fútil. Os adultos, por sua vez, fingem que aceitam a atitude grosseira, ou se acovardam, deixando de exercer a autoridade de educadores, cujo resultado previsível é a incivilidade.
Muitas pessoas estão deixando de freqüentar os cinemas para evitar constrangimentos com platéias mal educadas, barulhentas, parecendo estar mais interessadas em comer pipoca e dar arrotos de refrigerantes do que assistir ao filme em silêncio. (Existe diferença entre a demonstração de incivilidade do MLST no Congresso Nacional, as depredações das escolas públicas, ou outras menos barulhentas promovidas pelas gangs no dia-a-dia urbano?).
Mede-se o nível de ensino de uma universidade pelo grau de silêncio de sua biblioteca. Alunos de alguns cursos de nível superior são mais propensos ao zunzunzun da “conversa paralela” que, sem querer-querendo, termina atrapalhando o silêncio imprescindível para ouvir uma exposição oral. Se o assunto é complexo e/ou o professor tem o estilo monótono, aumenta a probabilidade de dispersão e cochichos inconvenientes. O historiador Peter Burke observa que essa inclinação para romper a romper com o silêncio necessário de uma aula, nos países latinos, talvez viria de costume cultural de “tentar ouvir muitas pessoas falando ao mesmo tempo”. Ao contrário do costume anglo-saxônico que exige total silêncio da audiência, o palestrante para público latino-americano deve estar preparado para discorrer seu assunto tendo como ruído de fundo o zumbido de vozes. Curiosamente, ele seria considerado mal educado ou impolido se pedir silêncio, deixando transparecer certa irritação para com os verdadeiros mal educados.

A sabedoria do silêncio

A sabedoria do silêncio
Revista Espaço Acadêmico, nº. 62, julho de 2006
RAYMUNDO DE LIMA

“Dentre todas as manifestações humanas, o silêncio continua sendo a que, de maneira muito pura, melhor exprime a estrutura densa e compacta, sem ruído nem palavras, de nosso inconsciente próprio” (J.-D. Nasio)

“O analista não tem medo do silêncio [...]; ele não escuta somente o que está nas palavras, escuta também o que as palavras não dizem. Escuta com a “terceira orelha”... (T. Reik)

"Na Finlândia, se você está feliz, deve estar em silêncio para ouvir os próprios pensamentos” (?)

É praticamente impossível esperar que crianças e adolescentes naturalmente fiquem em silêncio numa missa, aula, teatro, concerto musical, reunião, cinema. Os adultos, por sua vez, deviam dar o exemplo ficando de boca fechada nas igrejas antes ou durante missa, numa palestra, na biblioteca, etc. Será que existe medo do silêncio, necessário para reflexão?
Para ler e compreender um texto filosófico ou teológico, um poema, é preciso silêncio. Há músicas que só podem ser ouvidas sob um fundo de silêncio. Os retiros espirituais são importantes para capacitar as pessoas a conviverem melhor consigo mesmas; aprender a controlar a inquietação de nossa alma, rumo à ascese. Não “treinar” o silêncio é se entregar à fala vazia ou boba, reforçando um estilo sustentado na ignorância.
“O combate contra a ignorância é a meta de toda educação” diz o professor da UFMG, Roberto Jamil Cury. “Se a barbárie está presente através de atos na própria civilização, desbarbarizar tornou-se uma questão urgente da educação”, alertava o filósofo T. Adorno, na década de 1950.
Contudo, o elogio ao silêncio como sinal de educação deve ser rompido, sempre, para protestar contra os atos que causam direta ou indiretamente indignação, violência e destruição.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Mário Quintana

EVOLUÇÃO
O que me impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de que ele venha a ser nosso futuro.
Mario Quintana - Caderno H



MÚSICA
O que mais me comove em música
São estas notas soltas
- pobres notas únicas -
Que do teclado arranca o afinador de pianos.

Mario Quintana



OS DEGRAUS
Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...
Mario Quintana - Baú de Espantos


DA OBSERVAÇÃO
Não te irrites, por mais que te fizerem...
Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
Teu mais amável e sutil recreio...
Mario Quintana - Espelho Mágico

ESPELHO
Por acaso, surpreendo-me no espelho:
Quem é esse que me olha e é tão mais velho que eu? (...)
Parece meu velho pai - que já morreu! (...)
Nosso olhar duro interroga:
"O que fizeste de mim?" Eu pai? Tu é que me invadiste.
Lentamente, ruga a ruga... Que importa!
Eu sou ainda aquele mesmo menino teimoso de sempre
E os teus planos enfim lá se foram por terra,
Mas sei que vi, um dia - a longa, a inútil guerra!
Vi sorrir nesses cansados olhos um orgulho triste...
Mario Quintana
SEISCENTOS E SESSENTA E SEIS
A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo...
Quando se vê, já é 6ªfeira...
Quando se vê, passaram 60 anos...
Agora, é tarde demais para ser reprovado...
E se me dessem - um dia - uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio.
seguia sempre, sempre em frente ...

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.
Mario Quintana ( In: Esconderijo do tempo)


OS POEMAS
Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...

Mario Quintana - Esconderijos do Tempo


AH! OS RELÓGIOS

Amigos, não consultem os relógios
quando um dia eu me for de vossas vidas
em seus fúteis problemas tão perdidas
que até parecem mais uns necrológios...

Porque o tempo é uma invenção da morte:
não o conhece a vida - a verdadeira -
em que basta um momento de poesia
para nos dar a eternidade inteira.

Inteira, sim, porque essa vida eterna
somente por si mesma é dividida:
não cabe, a cada qual, uma porção.

E os Anjos entreolham-se espantados
quando alguém - ao voltar a si da vida -
acaso lhes indaga que horas são...

Mario Quintana - A Cor do Invisível


DAS UTOPIAS

Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos se não fora
A mágica presença das estrelas!

Mario Quintana - Espelho Mágico



POEMINHO DO CONTRA

Todos estes que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!

Mario Quintana


EU ESCREVI UM POEMA TRISTE

Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas da sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
Mas das mudanças do Tempo,
Que ora nos traz esperanças
Ora nos dá incerteza...
Nem importa, ao velho Tempo,
Que sejas fiel ou infiel...
Eu fico, junto à correnteza,
Olhando as horas tão breves...
E das cartas que me escreves
Faço barcos de papel!
Mario Quintana - A Cor do Invisível

CANÇÃO DO AMOR IMPREVISTO
Eu sou um homem fechado.
O mundo me tornou egoísta e mau.
E a minha poesia é um vício triste,
Desesperado e solitário
Que eu faço tudo por abafar.
Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada,
Com o teu passo leve,
Com esses teus cabelos...
E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender
nada, numa alegria atônita...
A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil
Aonde viessem pousar os passarinhos.
Mario Quintana



RECORDO AINDA

Recordo ainda... e nada mais me importa...
Aqueles dias de uma luz tão mansa
Que me deixavam, sempre, de lembrança,
Algum brinquedo novo à minha porta...

Mas veio um vento de Desesperança
Soprando cinzas pela noite morta!
E eu pendurei na galharia torta
Todos os meus brinquedos de criança...

Estrada afora após segui... Mas, aí,
Embora idade e senso eu aparente
Não vos iludais o velho que aqui vai:

Eu quero os meus brinquedos novamente!
Sou um pobre menino... acreditai!...
Que envelheceu, um dia, de repente!...

Mario Quintana

DOS MUNDOS
Deus criou este mundo. O homem, todavia,
Entrou a desconfiar, cogitabundo...
Decerto não gostou lá muito do que via...
E foi logo inventando o outro mundo.
Mario Quintana - Espelho Mágico

DA DISCRIÇÃO
Não te abras com teu amigo
Que ele um outro amigo tem.
E o amigo do teu amigo
Possui amigos também...
Mario Quintana - Espelho Mágico


A VERDADEIRA ARTE DE VIAJAR
A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo.
Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali...
Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando!
Mario Quintana - A verdadeira cor do invisível


O MAPA
Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...
(É nem que fosse o meu corpo!)
Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...
Há tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Há tanta moça bonita
Nas ruas que não andei
(E há uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)
Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso
Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)
E talvez de meu repouso...
Mario Quintana - Apontamentos de História Sobrenatural






domingo, 18 de abril de 2010

Drummond - Poemas

As sem-razões do amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabe sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque te amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.


José

E agora, José ?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José ?
e agora, você ?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama protesta,
e agora, José ?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José ?
E agora, José ?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora ?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora ?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José !
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José !
José, para onde ?


No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.


Poema das Sete Faces

Quando eu nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração
Porém meus olhos
não perguntam nada
O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucas, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.
Meu Deus por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo,
Se eu me chamasse Raimundo
seria apenas rima, não seria solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.


Os ombros suportam o mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rudo trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.


Mãos Dadas

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.


Receita de Ano Novo

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegrama?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um ano-novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

"Receita de Ano Novo" e foi lancado em 1977 no livro "Discurso de primavera e algumas sombras", Rio de janeiro, Record. [2a. edicao aumentada, Livraria Jose' Olympio Editora, 1978].


Também já fui brasileiro

Eu também já fui brasileiro
moreno como vocês.
Ponteei viola, guiei forde
e aprendi na mesa dos bares
que o nacionalismo é uma virtude.
Mas há uma hora em que os bares se fecham
e todas as virtudes se negam.
Eu também já fui poeta.
Bastava olhar para mulher,
pensava logo nas estrelas
e outros substantivos celestes.
Mas eram tantas, o céu tamanho,
minha poesia perturbou-se.
Eu também já tive meu ritmo.
Fazia isso, dizia aquilo.
E meus amigos me queriam,
meus inimigos me odiavam.
Eu irônico deslizava
satisfeito de ter meu ritmo.
Mas acabei confundindo tudo.
Hoje não deslizo mais não,
não sou irônico mais não,
não tenho ritmo mais não.


Hino Nacional

Precisamos descobrir o Brasil!
Escondido atrás das florestas,
com a água dos rios no meio,
O Brasil está dormindo, coitado.
Precisamos colonizar o Brasil.
O que faremos importando francesas
muito louras, de pele macia,
alemãs gordas, russas nostálgicas para
garçonettes dos restaurantes noturnos.
E virão sírias fidelíssimas.
Não convém desprezar as japonesas...,
Precisamos educar o Brasil.
Compraremos professores e livros,
assimilaremos finas culturas,
abriremos dancings e subvencionaremos as elites.
Cada brasileiro terá sua casa
com fogão e aquecedor elétricos, piscina,
salão para conferências científicas.
E cuidaremos do Estado Técnico.
Precisamos louvar o Brasil.
Não é só um país sem igual.
Nossas revoluções são bem maiores
do que quaisquer outras; nossos erros também.
E nossas virtudes? A terra das sublimes paixões...
os Amazonas inenarráveis... os incríveis Jõao-Pessoas...
Precisamos adorar o Brasil!
Se bem que seja difícil caber tanto oceano e tanta solidão
no pobre coração já cheio de compromissos...
se bem que seja difícil compreender o que querem esses homens,
por que motivo eles se ajuntaram e qual a razão de seus sofrimentos.
Precisamos, precisamos esquecer o Brasil!
Tão majestoso, tão sem limites, tão despropositado,
ele quer repousar de nossos terríveis carinhos.
O Brasil não nos quer! Está farto de nós!
Nosso Brasil é no outro mundo. Este não é o Brasil.
Nenhum BRasil existe. E acaso existirão os brasileiros?

1934, Brejo das almas (Poemas). Belo Horizonte, Os Amigos do Livro


Poema Patético

Que barulho é esse na escada?
É o amor que está acabando,
é o homem que fechou a porta
e se enforcou na cortina.
Que barulho é esse na escada?
É Guiomar que tapou os olhos
e se assoou com estrondo.
É a lua imóvel sobre os pratos
e os metais que brilham na copa.
Que barulho é esse na escada?
É a torneira pingando água,
e o lamento imperceptível
de alguém que perdeu no jogo
enquanto a banda de música
vai baixando, baixando de tom.
Que barulho é esse na escada?
É a virgem com um trombone,
a criança com um tambor,
o bispo com uma campainha
e alguém abafando o rumor
que salta de meu coração.
1934, Brejo das almas (Poemas). Belo Horizonte, Os Amigos do Livro



Quero

Quero que todos os dias do ano
todos os dias da vida
de meia em meia hora
de 5 em 5 minutos
me digas: Eu te amo.
Ouvindo-te dizer: Eu te amo,
creio, no momento, que sou amado.
No momento anterior
e no seguinte,
como sabê-lo?
Quero que me repitas até a exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação
pois ao dizer: Eu te amo,
dementes
apagas
teu amor por mim.
Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.
Quero ser amado por e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso,
a perfeita maneira de saber-se amado:
amor na raiz da palavra
e na sua emissão,
amor
saltando da língua nacional,
amor
feito som
vibração espacial.
No momento em que não me dizes:
Eu te amo,
inexoravelmente sei
que deixaste de ama-me,
que nunca me amaste antes.
Se não me disseres urgente repetido
Eu te amoamoamoamoamo,
verdade fulminante que acabas de desentranhar,
eu me precipito no caos,
essa coleção de objetos de não-amor.


Diante de uma criança

Como fazer feliz meu filho?
Não há receitas para tal.
Todo o saber, todo o meu brilho
de vaidoso intelectual
vacila ante a interrogação
gravada em mim, impressa no ar.
Bola, bombons, patinação
talvez bastem para encantar?
Imprevistas, fartas mesadas,
louvores, prêmios, complacências,
milhões de coisas desejadas,
concedidas sem reticências?
Liberdade alheia a limites,
perdão de erros, sem julgamento,
e dizer-lhe que estamos quites,
conforme a lei do esquecimento?
Submeter-se à sua vontade
sem ponderar, sem discutir?
Dar-lhe tudo aquilo que há
de entontecer um grão-vizir?
E se depois de tanto mimo
que o atraia, ele se sente
pobre, sem paz e sem arrimo,
alma vazia, amargamente?
Não é feliz. Mas que fazer
para consolo desta criança?
Como em seu íntimo acender
uma fagulha de confiança?
Eis que acode meu coração
e oferece, como uma flor,
a doçura desta lição:
dar a meu filho meu amor.
Pois o amor resgata a pobreza,
vence o tédio, ilumina o dia
e instaura em nossa natureza
a imperecível alegria.
1996. "Farewell". (Poemas). Rio de Janeiro. Editora Record



Brás Cubas... Machado de Assis

M. Póstumas de Brás Cubas

J.M. Machado de Assis
Prosa Realista - 1881

Vida
Nasceu no dia 21 de junho de 1839 no Rio de Janeiro, mais precisamente no Morro do Livramento. Nasceu simplesmente um moleque de morro, franzino e doentio. Era filho de um pintor de paredes, Francisco José de Assis, e de uma portuguesa, Maria Leopoldina.
Quando ainda pequeno, ficou órfão de mãe. O pai casou-se novamente e a madrasta, Maria Inês, contrariando a lenda, substituiu em cuidados e carinhos a mãe verdadeira e também o pai, que morreria logo depois. Machado cresceu ao lado de Maria Inês, lavadeira e doceira, cujas balas o menino vendia na porta dos colégios que não podia freqüentar.
Naqueles tempos, escola era um privilégio dos mais afortunados. O menino, aliás, nunca freqüentaria qualquer escola. Machado é, hoje, o maior exemplo de autodidatismo no Brasil.
Tímido e introspectivo, Machado teve uma vida sóbria, comportada, sem grandes travessuras de criança, nem grandes aventuras de rapaz.
• 1855 - aos dezesseis anos, publica seu primeiro poema Ela na Marmota Fluminense. Esse poema só foi publicado porque Paula Brito, dono de uma tipografia e de uma livraria, simpatizou-se com o rapaz e fez dele seu protegido.
• 1856 e 1858 - Machado trabalha como topógrafo, primeiro na Imprensa Nacional e depois na tipografia de Paula Brito. Nessa época conhece um jornalista famoso, Manuel Antônio de Almeida, e outros intelectuais.
• 1858 e 1867 - Machado colabora assiduamente em muitos jornais e revistas cariocas, nos publicava contos, crônicas e crítica teatral. No ano de 1857 ingressa no funcionalismo público, em que sucessivamente teve funções cada vez mais importantes e chegou a ser um funcionário de prestígio.
• 1869 - casa-se com Carolina Xavier de Novais, irmã do poeta Faustino Xavier, que viera de Portugal para uma viagem cultural pelo Brasil. O casamento que iria durar 35 anos e ser dos mais felizes foi tumultuado, pois os pais de Carolina, portugueses preconceituosos, não queriam a união da filha com um mulato. Carolina viria a dar ao pacato e caseiro Machado de Assis a companhia ideal em sua fase de produção literária.
• 1870 - Machado nos premia com uma intensa atividade literária e com sucessivas publicações: contos, romances, poesia, teatro e crítica literária.
• 1881 - Machado atinge sua maturidade literária e publica Memórias Póstumas de Brás Cubas, um romance. Essa obra vem a ser um marco na história da Literatura Brasileira.
• 1882 - aparece Papéis Avulsos, uma seleção admirável de contos.
• 1891- aparece Quincas Borba, o mais filosófico dos romances machadianos.
• 1896 - é fundada a Academia Brasileira de Letras, e Machado de Assis, um ano depois, é aclamado seu presidente perpétuo.
• 1899 - surgem Dom Casmurro, romance, obra-prima de drama moral, e Páginas Recolhidas, seleção de contos.
• 1904 - é publicado o romance Esaú e Jacó, e também morre sua esposa Carolina.
• 1908 - morre Machado de Assis, festejado, em todos os sentidos, como o maior escritor brasileiro.

Obra
A classificação (rotulação) de Machado dentro de escolas e movimentos é problemática e atende apenas à comodidade didática. O mesmo ocorre com a divisão de sua obra em fases: a primeira (Romântica) e a segunda (Realista). O que houve em Machado foi um contínuo aperfeiçoamento.


Sua obra abrange os seguintes gêneros literários:
• Poesia - Crisálidas, Falenas e Americanas (fase romântica) e Ocidentais (fase parnasiana)
• Teatro - Desencantos, A Queda que as Mulheres têm para os Tolos, Quase Ministro, Os Deuses de Casa, Tu, Só Tu, Puro Amor, entre outras. É o aspecto menor da obra machadiana. São mais contos dialogados, que peças teatrais.
• Crítica - Abrangendo literatura e teatro.
• Crônica - Reunida no livro A Semana.
• Conto - Tão importante quanto o romance machadiano. Contos Fluminenses, Histórias da Meia-Noite, Papéis Avulsos, Histórias sem Data, Várias Histórias e Relíquias da Casa Velha.
• Romance - Fase romântica: Ressureição, A Mão e a Luva, Helena e Iaiá Garcia. Apesar de rotulados "românticos" , há nesses romances elementos realistas: a análise psicológica e o fato de que as heroínas ajam por interesse na obtenção de "status" social e não por amor, mola central da narrativa romântica. Fase realista: Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e D. Casmurro, que constituem a Trilogia Machadiana, Esaú e Jacó e Memorial de Aires.
Considerações Gerais
A ruptura com a narrativa linear:
Os fatos e as ações não seguem um fio lógico ou cronológico, obedecem a um ordenamento interior, são relatados à medida que afloram à consciência ou à memória do narrador, num processo que se aproxima do impressionismo.

A organização metalingüística do discurso narrativo:
É comum, na ficção machadiana, que o narrador interrompa a narrativa para, com saborosa e bem-humorada bisbilhotice, comentar com o leitor a própria escritura do romance, fazendo-o participar de sua construção; ou ainda, para dialogar sobre uma personagem, refletir sobre um episódio do enredo ou tecer suas digressões sobre os mais variados assuntos.
Machado assume a posição de quem escreve e ao mesmo tempo se vê escrevendo. Esses comentários à margem da narração constituem o principal interesse, pois neles está a mensagem artística do escritor.

O universalismo
Machado captou na sociedade carioca do século XIX, os grandes temas de sua obra. O seu interesse jamais recaiu sobre o típico, o pitoresco, a cor local, o exótico, tão ao gosto dos românticos. Buscou, na sociedade do seu tempo, o universal, a essência humana, os grandes valores filosóficos: a essência e a aparência; o caráter relativo da moral humana; as convenções sociais e os impulsos interiores; a normalidade e a loucura, o acaso, o ciúme, a irracionalidade, a usura, a crueldade.
A pobreza de descrições, a quase ausência da paisagem são ainda desdobramentos dessa concentração na análise psicológica e na reflexão filosófica. As tramas dos romances machadianos poderiam, sem grandes prejuízos à narrativa, ser transplantadas para qualquer época e qualquer cidade.

Os grandes arquétipos
Uma das linhas mestras da ficção machadiana parte do aproveitamento dos arquétipos, que remontam à tradição clássica e aos textos bíblicos. (Arquétipo = modelo de seres criados; padrão exemplar; imagens psíquicas do inconsciente coletivo, e que são o patrimônio coletivo de toda a humanidade.)
Assim, o conflito dos irmãos Pedro e Paulo, em Esaú e Jacó, remonta ao arquétipo bíblico da rivalidade entre Caim e Abel; a psicose do ciúme de Bentinho, em D. Casmurro, aproxima-se do drama de Otelo e Desdêmona, de Shakespeare.

O pessimismo
Machado revela sempre uma visão desencantada da vida e do homem. Não acreditava nos valores do seu tempo e, a rigor, não acreditava em nenhum valor. Mais do que pessimista ou negativa, sua postura é niilista ("nil" - nada). O desmascaramento do cinismo e da hipocrisia, do egoísmo e do interesse, que se camuflavam sob as convenções sociais é o cerne de grande parte da ficção machadiana.
O capítulo final de Memórias Póstumas, o antológico das negativas, é exemplo cabal do pessimismo do autor:

Capítulo CLX
Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplastro, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de Dona Plácida, nem a semidemência do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e conseguintemente que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: - Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.

A ironia, o humor negro
A forma de revolta de Machado era o rir; quase sempre um riso amargo que exteriorizava o desencanto e o desalento ante a miséria física e moral de suas personagens. Observem o texto:

Daqui inferi eu que a vida é o mais engenhoso dos fenômenos, porque só aguça a fome , com o fim de deparar a ocasião de comer, e não inventou os calos, senão porque eles aperfeiçoam a felicidade terrestre. Em verdade vos digo que toda a sabedoria humana não vale um par de botas curtas.
Tu minha Eugênia, é que não as descalçaste nunca; foste aí pela estrada da vida, manquejando da perna e do amor, triste como os enterros pobres, solitária, calada, laboriosa, até que vieste também para esta outra margem... O que eu sei é se a tua existência era muito necessária ao século. Quem sabe? Talvez um comparsa de menos fizeste patear a tragédia humana.


Resumo
Brás Cubas, já falecido, conta, do outro mundo, as suas memórias: Expirei em 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Galhofando dos ascendentes, fala da própria genealogia. Assevera que morreu de pneumonia apanhada quando trabalhava num invento farmacêutico, um emplastro medicamentoso. Virgília, sua ex-amante, que já não via há alguns anos, visitou-o nos últimos dias de vida. Narra Brás Cubas um delírio que teve durante a agonia: montado num hipopótamo foi arrebatado por uma extensa e gelada planície, até o alto de uma montanha, de onde divisa a sucessão dos séculos.
Além dos pais, tiveram grande influência na educação do pequeno Brás Cubas três pessoas: tio João, homem de língua solta e vida galante; tio ldefonso, cônego, piedoso, e severo; Dona Emerenciana, tia materna, que viveu pouco tempo. Brás passou uma infância de menino traquinas, mimado demasiadamente pelo pai. Aos dezessete anos apaixona-se por Marcela, dama espanhola, com quem teve as primeiras experiências amorosas. Para agradar Marcela, Brás começa a gastar demais, assumindo compromissos graves e endivida-se. Marcela gostava de jóias, e Brás procurava fazer-lhe todos os gostos. Marcela amou-me, diz Brás Cubas, durante quinze meses e onze contos de réis. Quando o pai tomou conhecimento dos esbanjamentos do filho, mandou-o para a Europa: vais cursar uma Universidade, justificou. Em Coimbra, Brás segue o curso jurídico e bachare-la-se. Depois, atendendo a um chamado do pai, volta ao Rio: a mãe estava moribunda. E, de fato chega ao Brasil, e a mãe falece. Passando uns dias na Tijuca, conhece Eugênia, moça bonita, mas com um defeito na perna que a fazia coxear um pouco. Com ela mantém um romance passageiro.
O pai de Brás tem duas ambições para o filho: quer casá-lo e fazê-lo deputado. Tudo faz para encaminhá-lo no rumo do casamento e procura aumentar o círculo de amigos influentes na política, a fim de preparar o caminho para o futuro deputado. Assim é que Brás Cubas é apresentado ao Conselheiro Dutra, que promete ajudar ao jovem bacharel na pretendida ascensão política.
Brás nesta altura vem a conhecer Virgília, filha do Conselheiro Dutra, pela qual se apaixona. Parecia, com isso, que os sonhos do pai sobre Brás estavam prestes a realizar-se: bem-encaminhado na política e quase noivo. Entretanto acontece um imprevisto: surge Lobo Neves, que não somente lhe rouba a namorada, mas também cai nas boas graças do Conselheiro Dutra. Vendo assim preterido o filho, o pai de Brás sente-se profundamente desapontado e magoado. Veio a falecer dali a alguns meses, de um desastre.
Virgília casa-se com Lobo Neves e, pouco tempo depois, vê eleito deputado o marido. Mas, na verdade, Virgília casara-se com Lobo por interesse, e ama realmente Brás Cubas. Virgília e Brás principiam a encontrar-se com freqüência e, em breve, tornam-se amantes . Lobo Neves adora a esposa e nela confia inteiramente. Aliás não tinha muito tempo para observar o que se passa, já que estava entregue totalmente à política.
Narra nesta altura Brás Cubas o encontro que teve com seu ex-colega de escola primária, Quincas Borba, que se tornara um infeliz mendigo de rua. Depois do encontro com Quincas, Brás percebe que o maltrapilho lhe roubara o relógio.
Os encontros amorosos entre Virgília e Brás suscitam comentários e mexericos dos vizinhos, amigos e conhecidos. Por esse motivo, Brás propõe a Virgília a fuga para um lugar distante. Virgília, porém, pensa no marido que a ama e na família, e sugere uma casinha só nossa, metida num jardim, em alguma rua escondida. A idéia parece boa a Brás, que sai remoendo a proposta: uma casinha solitária, em alguma rua escura. Virgília e sua ex-empregada, chamada Dona Plácida, se encarregam de adornar a casa e, aparentemente, quem ali reside é Dona Plácida. Ali os dois amantes se encontram sem maiores embaraços, e sem despertarem suspeitas.
Sucede que, por motivos políticos, Lobo Neves é designado como presidente de uma província e, dessa, forma, tem de afastar-se com a mulher. Brás fica desesperado e pede a Virgília que não o abandone. Quando tudo parece sem solução, eis que surge Lobo Neves e, para agradar ao amigo da família, convida Brás Cubas a acompanhá-lo, como secretário. Brás aceita. Os mexericos se tornam mais intensos e Cotrim, casado com Sabina, irmã de Brás Cubas, procura fazer ver ao cunhado que a viagem seria uma aventura muito perigosa. Mais por superstição do que pelos conselhos de Cotrim, Lobo Neves acaba não aceitando mais o cargo de presidente, porque o decreto de nomeação saíra publicado no Diário Oficial num dia 13, e Lobo Neves tinha pavor do número treze considerado um número fatídico.
Lobo Neves recebe uma carta anônima denunciando os amores da esposa com o amigo. Isso faz com que os dois amantes se mostrem mais reservados, embora continuem encontrando-se na Gamboa (onde ficava a casa de Dona Plácida). Surge então um acontecimento que vem alterar a situação dos personagens: Lobo Neves é novamente nomeado presidente, e desta vez parte então para o interior do país, levando consigo a esposa. Brás procura distrair-se e esquecer a separação. Aliás, o tempo se havia escoado e, embora ainda se sentisse forte e com saúde, era já um cinquentão.
A irmã Sabina, que vinha procurando "arranjar" um casamento para Brás, volta a insistir em seu objetivo. A candidata, uma moça prendada, chamava-se Nhá-Loló. Mesmo sem entusiasmo, Brás aparenta interesse pela pretendente, mas Nhá-Loló vem a falecer durante uma epidemia.
O tempo vai passando. Mais por distração do que por idealismo. Faz-se deputado e, na assembléia, vem a encontrar-se com Lobo Neves que havia voltado da província . Encontra-se também com Virgília, que não tinha a beleza antiga que o havia atraído anteriormente. Assim, por desinteresse recíproco, chegam ao fim os amores de Brás e Virgília.
Quincas Borba, o mendigo, reaparece e lhe restitui o relógio, passando a ser um freqüentador da casa de Brás. Quincas Borba estava mudado: não era mais mendigo, recebera uma herança de um tio em Barbacena. Virara filósofo: havia inventado uma nova teoria filosófica-religiosa, o Humanismo, e não falava noutra coisa. O próprio Brás Cubas passa a interessar-se muito pelas teorias de Quincas Borba.
Morre, por esse tempo, Lobo Neves, e Virgília chorou com sinceridade o marido, como o havia traído com sinceridade. Também vem a falecer Quincas Borba, que havia enlouquecido completamente.
Brás Cubas deixou este mundo pouco depois de Quincas Borba, por causa de uma moléstia que apanhara quando tratava de um invento seu, denominado emplastro Quincas Borba. E o livro conclui: Ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas (refere-se ao último capítulo do livro): não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria".

Personagens
• Brás Cubas - narrador - morto aos 64 anos - “ainda próspero e rijo”, fidalgo
• Marcela - Segundo grande amor de Brás Cubas, uma prostituta de elite, cujo amor por Brás duraria quinze meses e onze contos de réis.
• Virgilia - filha do comendador Dutra, segundo o pai de Brás, Bento Cubas A “Ursa Maior” amante de Brás Cubas casa-se com Lobo Neves por interesse.
• Quincas Borba - menino terrível que dava tombos no paciente professor Barata, colega de escola de Brás que o encontrará mais tarde mendigo que rouba-lhe um relógio mas retorna-o ao colega após receber uma herança. Desenvolve a filosofia do humanismo: “Ao vencedor as batatas ao vencido ódio ou compaixão”.
• Eugênia - Filha de Eusébia e Vilaça, menina bela embora coxa.
• Nhá Loló - moça simplória, tinha dotes de soprano - morre de febre amarela..
• Cotrim - casado com Sabina, irmã de Brás; ambos interesseiros
• Nhonhô - filho de Virgília
• D. Plácida empregada de Virgília confidente e protetora de sua realção - extra conjungal
• Lobo Neves - casado com Virgília, homem frio e calculista.

Belos pensamentos...

"O PORTO DISTANTE"

"Existe uma velha crença,
de que em algum porto distante,
longe da dor e da descrênça,
hão de se encontrar um dia,
amigos dos velhos tempos".




"Mente capaz significa pensamento concentrado e firme. Então, as Leis do Universo se colocam a seu favor e você se torna um verdadeiro agente de transformação para o bem". (Ramatis)



"Um vencedor enxerga uma resposta para cada problema;
Um perdedor enxerga um problema para cada resposta".
(Kung Fú)



"TUDO É IMPORTANTE E AS PESSOAS SÃO MUITO MAIS IMPORTANTES DO QUE TUDO!"
(Mg AMORIFER)



"DECISÃO É PODER"

Escreva descrições claras e concisas das suas metas.
Escreva as datas de realizações delas.
Escreva as providências que tomará para atingí-las.


"Veja a fantástica abundancia universal que o cerca".
(James Lee Valentine)


"Determine que a coisa pode e deve ser feita, e então descobriremos como fazê-la".
(Abrahan Lincoln)


"O começo é a parte mais importante do trabalho".
(Platão)


"A vida exige toneladas de disciplina".
(Robert Frost)


"O que você está fazendo para expandir seus talentos e características?"
(Vedran Smailovic)


"A preparação de hoje decide as realizações de amanhã".
(Thomas Edson)


"Na aventura de cada dia, descobrimos o melhor de nós mesmos".
(James Lee Valentine)


"É você quem cria as suas próprias oportunidades".
(Chuck Norris)


"Escolha metas magníficas!"
(James Lee Valentini)


"Descobrir consiste em ver o que todo mundo já viu e pensar o que ninguém ainda pensou".
(Albert Szent-Gyorgyi)


"PSICOLOGIA DO BUDISMO TIBETANO"

"A decisão é sua, os Mestres apenas apontam o caminho". (Buda)


Não há outra realidade a não ser agora. Tudo começa hoje.

Usar o tempo corretamente é colher a essência da vida!

O que imaginamos exerce um poder maior sobre nós do que aquilo que vemos.

O controle interior é uma virtude das pessoas que se dedicam ao autoconhecimento.

Temos que adquirir a habilidade de nos auto-observar internamente.

Aprendemos a ser pacientes com a nossa própria raiva!

Podemos criar o hábito de não reclamar!

controlando o corpo e a fala, será mais fácil controlar a mente.

(Bel Cesar)



"Você pode ser seu próprio analista, apenas observando a si mesmo em todos os momentos".
(John Welwood)

POEMA: Almas Perfumadas




Almas Perfumadas

Tem gente que tem cheiro de passarinho
quando canta.
De sol quando acorda.
De flor quando ri.
Ao lado delas, a gente se sente
no balanço de uma rede
que dança gostoso numa tarde grande,
sem relógio e sem agenda.
Ao lado delas, a gente se sente
comendo pipoca na praça.
Lambuzando o queixo de
sorvete.
Melando os dedos com algodão doce
da cor mais doce que tem pra
escolher.
O tempo é outro.
E a vida fica com a cara que ela tem de verdade,
mas que a gente desaprende de ver.
Tem gente que tem cheiro de colo de Deus.
De banho de mar quando a água
é quente e o céu é azul.
Ao lado delas, a gente sabe
que os anjos existem e
que alguns são invisíveis.
Ao lado delas, a gente
se sente chegando em casa
e trocando o salto pelo chinelo.
Sonhando a maior tolice do mundo com o
gozo de quem não liga pra isso.
Ao lado delas, pode ser abril, mas parece
manhã de Natal do tempo em que
a gente acordava e encontrava o presente do
Papai Noel.
Tem gente que tem cheiro das estrelas
que Deus acendeu no céu e daquelas
que conseguimos acender na Terra.
Ao lado delas, a gente não acha que
o amor é possível, a gente tem certeza.
Ao lado delas, a gente se sente
visitando um lugar feito de alegria.
Recebendo um buquê de carinhos.
Abraçando um filhote de urso panda.
Tocando com os olhos os olhos da paz.
Ao lado delas, saboreamos a delícia
do toque suave que sua presença sopra
no nosso coração.
Tem gente que tem cheiro de cafuné sem pressa.
Do brinquedo que a gente não largava.
Do acalanto que o silêncio canta.
De passeio no jardim.
Ao lado delas, a gente percebe que
a sensualidade é um perfume
que vem de dentro e
que a atração que realmente nos move
não passa só pelo corpo.
Corre em outras veias.
Pulsa em outro lugar.
Ao lado delas, a gente lembra que no
instante em que rimos Deus está conosco,
juntinho ao nosso lado.
E a gente ri grande, que nem menino arteiro.
(não conheço o autor)

Resumo: Dom Casmurro

Dom Casmurro
Machado de Assis
Vivendo no Engenho Novo, um subúrbio da cidade do Rio de Janeiro, quase recluso em sua casa, construída segundo o molde da que fora a de sua infância, na Rua de Matacavalos, Bento de Albuquerque Santiago, com cerca de 54 anos e conhecido pela alcunha de Dom Casmurro por seu gosto pelo isolamento, decide escrever sua vida.
Alternando a narração dos fatos passados com a reflexão sobre os mesmos, no presente, o protagonista/narrador informa ter nascido em 1842 e ser filho de Pedro de Albuquerque Santiago e de D. Maria da Glória Fernandes Santiago. O pai, dono de uma fazendola em ltaguaí, mudara-se para a cidade do Rio de Janeiro por volta de 1844, ao ser eleito deputado. Alguns anos depois falece e a viúva, preferindo ficar na cidade a retornar a ltaguaí, vende a fazendola e os escravos, aplica seu dinheiro em imóveis e apólices e passa a viver de rendas, permanecendo na casa de Matacavalos, onde vivera com o marido desde a mudança para o Rio de Janeiro.
A vida do protagonista/narrador transcorre sem maiores incidentes até a "célebre tarde de novembro" de 1857, quando, ao entrar em casa, ouve pronunciarem seu nome e esconde-se rapidamente atrás da porta. Na conversa entre sua mãe e o agregado José Dias, que morava com a família desde os tempos de ltaguaí, Bentinho, como era então chamado, fica sabendo que sua mãe se mantém firme na intenção de colocá-lo no seminário a fim de seguir a carreira eclesiástica, segundo promessa que fizera a Deus caso tivesse um segundo filho varão, já que o primeiro morrera ao nascer.
Bentinho, que há muito tinha conhecimento das intenções de sua mãe, sofre violento abalo, pois fica sabendo que a reativação da promessa, que parecia esquecida, devia-se ao fato de José Dias ter informado D. Glória a respeito de seu incipiente namoro com Capitolina Pádua, que morava na casa ao lado. Capitu, como era chamada, tinha então catorze anos e era filha de um tal de Pádua, burocrata de uma repartição do Ministério da Guerra. A proximidade, a convivência e a idade haviam feito com que os dois adolescentes criassem afeição um pelo outro. D. Glória, ao saber disto, fica alarmada e decide apressar o cumprimento da promessa. Os planos de Capitu, informada do assunto, e Bentinho para, com a ajuda de José Dias, impedir que D. Glória cumprisse a decisão ou que, pelo menos, a adiasse, fracassam. Como último recurso, o próprio Bentinho revela à mãe não ter vocação, o que também não a faz voltar atrás. Tio Cosme, um viúvo, irmão de D. Glória e advogado aposentado que vivia na casa desde que seu cunhado falecera, e a prima Justina, também viúva, que, há muitos anos, morava com a mãe de Bentinho, procuram não se envolver no problema. Assim, a última palavra fica com D. Glória, que, com o apoio do padre Cabral, um amigo de Tio Cosme, decide finalmente cumprir a promessa e o envia ao seminário, prometendo, contudo, que se dentro de dois anos não revelasse vocação para o sacerdócio estaria livre para seguir outra carreira. Antes da partida de Bentinho, este e Capitu juram casar-se.
No seminário, Bentinho conhece Ezequiel de Sousa Escobar, filho de um advogado de Curitiba. Os dois tornam-se amigos e confidentes. Em um fim de semana em que Bentinho visita D. Glória, Escobar o acompanha e é apresentado a todos, inclusive a Capitu. Esta, depois da partida de Bentinho, começara a freqüentar assiduamente a casa de D. Glória, do que nascera aos poucos grande afeição recíproca, a ponto de D. Glória começar a pensar que se Bentinho se apaixonasse por Capitu e casasse com ela a questão da promessa estaria resolvida a contento de todos, pois Bentinho, que a quebraria, não a fizera, e ela, que a fizera, não a quebraria.
Enquanto isto, Bentinho continuava seus esforços junto a José Dias, que, tendo fracassado em seu plano de fazê-lo estudar medicina na Europa, sugeria agora que ambos fossem a Roma pedir ao Papa a revogação da promessa. A solução definitiva, contudo, partiu de Escobar. Segundo este, D. Glória prometera a Deus dar-lhe um sacerdote, mas isto não queria dizer que o mesmo deveria ser necessariamente seu filho. Sugeriu então que ela adotasse algum órfão e lhe custeasse os estudos. D. Glória consultou o padre Cabral, este foi consultar o bispo e a solução foi considerada satisfatória. Livre do problema, Bentinho deixa o seminário com cerca de 17 anos e vai a São Paulo estudar, tornando-se, cinco anos depois, o advogado Bento de Albuquerque Santiago. Por sua parte, Escobar, que também saíra do seminário, tornara-se um comerciante bem-sucedido, vindo a casar com Sancha, amiga e colega de escola de Capitu. Em 1865, Bento e Capitu finalmente casam, passando a morar no bairro da Glória. O escritório de advocacia progride e a felicidade do casal seria completa não fosse a demora em nascer um filho. Isto faz com que ambos sintam inveja de Escobar e Sancha, que tinham tido uma filha, batizada com o nome de Capitolina. Depois de alguns anos, nasce Ezequiel, assim chamado para retribuir a gentileza do casal de amigos, que dera à filha o nome da amiga de Sancha.
Ezequiel revela-se muito cedo um criança inquieta e curiosa, tornando-se a alegria dos pais e servindo para estreitar ainda mais as relações de amizade entre os dois casais. A partir do momento em que Escobar e Sancha, que moravam em Andaraí, resolvem fixar residência no Flamengo, a convivência entre as duas famílias torna-se completa e os pais chegam a falar na possibilidade de Ezequiel e Capituzinha, como era chamada a pequena Capitolina, virem a se casar.
Em 1871 Escobar, que gostava de nadar, morre afogado. No enterro, Capitu, que amparava Sancha, olha tão fixamente e com tal expressão para Escobar morto que Bento fica abalado e quase não consegue pronunciar o discurso fúnebre. A perturbação, contudo, desaparece rapidamente. Sancha retira-se em seguida para a casa dos parentes no Paraná, o escritório de Bento continua a progredir e a união entre o casal segue crescendo. Até o momento em que, cerca de um anos depois, advertido pela própria Capitu, Bento começa a perceber as semelhanças de Ezequiel com Escobar. À medida que o menino cresce, estas semelhanças aumentam a tal ponto que em Ezequiel parece ressurgir fisicamente o velho companheiro de seminário. As relações entre Bento e Capitu deterioram-se rapidamente. A solução de colocar Ezequiel num internato não se revela eficaz, já que Bento não suporta mais ver o filho, o qual, por sua vez, se apega a ele cada vez mais, tomando a situação ainda mais crítica.
Num gesto extremo, Bento decide suicidar-se com veneno, colocado numa xícara de café. Interrompido pela chegada de Ezequiel, altera intempestivamente seu plano e decide dar o café envenenado ao filho mas, no último instante, recua e em seguida desabafa, dizendo a Ezequiel que não é seu pai. Neste momento Capitu entra na sala e quer saber o que está acontecendo. Bento repete que não é pai de Ezequiel e Capitu exige que diga por que pensa assim. Apesar de Bento não conseguir expor claramente suas idéias, Capitu diz saber que a origem de tudo é a casualidade da semelhança, argumentando em seguida que tudo de deve à vontade de Deus. Capitu retira-se e vai à missa com o filho. Bento desiste do suicídio.
Durante a discussão fica decidido que a separação seria o melhor caminho. Para manter as aparências, o casal parte pouco depois rumo à Europa, acompanhado do filho. Bento retorna a seguir, sozinho. Trocam algumas cartas e Bento viaja outras vezes à Europa, sempre com o objetivo de manter as aparências, mas nunca mais chega a encontrar-se com Capitu. Tempos depois morrem D. Glória e José Dias.
Bento retira-se para o Engenho Novo. Ali, certo dia, recebe a visita de Ezequiel de Albuquerque Santiago, que era então a imagem perfeita de seu velho colega de seminário. Capitu morrera e fora enterrada na Europa. Ezequiel permanece alguns meses no Rio e depois parte para uma viagem de estudos científicos no Oriente Médio, já que era apaixonado pela arqueologia. Onze meses depois morre de febre tifóide em Jerusalém e é ali enterrado.
O adultério de Capitu não está bem esclarecido para o leitor, já que o próprio narrador-personagem, no decorrer da história, apresenta uma série de indícios, provas e contraprovas, como o fato de Capitu ser parecidíssima com a mãe de Sancha, sem haver, com toda certeza, qualquer parentesco entre elas.
Mortos todos, familiares e velhos conhecidos, Bento/Dom Casmurro fecha-se em si próprio, mas não se isola e encontra muitas amigas que o consolam. Jamais, porém, alguma delas o faz esquecer a primeira amada de seu coração, que o traíra com seu melhor amigo. Assim quisera o destino. Decide escrever um livro de memórias na tentativa de atar passado e presente, da "construção ou reconstrução" de si mesmo. É certo que, antes da narrativa, tenta recompor seu passado construindo uma casa em tudo semelhante à de sua adolescência, todavia esse artifício mostra-se inútil e frustrante. Por isso, passa a essa outra alternativa: a da narrativa, que se mostra eficaz. E após seu término, para esquecer tudo, nada melhor que escrever, segundo decide, um outro livro: uma História dos subúrbios do Rio de Janeiro.
Breves Comentários – personagens, narrador, narratário, fábula e trama
Em Dom Casmurro, as personagens são apresentadas a partir das descrições de seus dotes físicos Temos, portanto, a descrição, funcional, bastante comum no Realismo.
As personagens principais são :
• Capitu, "criatura de 14 anos, alta, forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma à outra, à moda do tempo, ... morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo ... calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos". Personagem que tem o poder de surpreender : "Fiquei aturdido. Capitu gostava tanto de minha mãe, e minha mãe dela, que eu não podia entender tamanha explosão". Segundo José Dias, Capitu possuía "olhos de cigana oblíqua e dissimulada", mas para Bentinho os olhos pareciam "olhos de ressaca"; "Traziam não sei que fluido misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro, com a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca".
• Bentinho, também protagonista, que ocupa uma postura de anti-herói. Não pretendia ser padre como determinara sua mãe, mas tencionava casar-se com Capitu, sua amiga de infância. Um fato interessante é que os planos, para não entrar no seminário, eram sempre elaborados por Capitu.
As personagens secundárias são descritas pelo narrador :
• Dona Glória, mãe de Bentinho, que desejava fazer do filho um padre, devido a uma antiga promessa, mas, ao mesmo tempo, desejava tê-lo perto de si, retardando a sua decisão de mandá-lo para o Seminário. Portanto, no início encontra-se como opositora, tornando-se depois, adjuvante. As suas qualidades físicas e espirituais...
• Tio Cosme, irmão de Dona Glória, advogado, viúvo, "tinha escritório na antiga Rua das Violas, perto do júri... trabalhava no crime"; "Era gordo e pesado, tinha a respiração curta e os olhos dorminhocos". Ocupa uma posição neutra : não se opunha ao plano de Bentinho, mas também não intervinha como adjuvante.
• José Dias, agregado, "amava os superlativos", "ria largo, se era preciso, de um grande riso sem vontade, mas comunicativo ... nos lances graves, gravíssimo", "como o tempo adquiriu curta autoridade na família, certa audiência, ao menos; não abusava, e sabia opinar obedecendo", "as cortesias que fizesse vinham antes do cálculo que da índole". Tenta, no início, persuadir Dona Glória à mandar Bentinho para o Seminário, passando-se, depois, para adjuvante.
• Prima Justina, prima de Dona Glória. Parece opor-se por ser muito egoísta, ciumenta e intrigante. Viúva, e segundo as palavras do narrador : "vivia conosco por favor de minha mãe, e também por interesse", "dizia francamente a Pedro o mal que pensava de Paulo, e a Paulo o que pensava de Pedro".
• Pedro de Albuquerque Santiago, falecido, pai de Bentinho. A respeito do pai o narrador coloca : "Não me lembro nada dele, a não ser vagamente que era alto e usava cabeleira grande; o retrato mostra uns olhos redondos, que me acompanham para todos os lados..."
• Sr. Pádua e Dona Fortunata, pais de Capitu. O primeiro, "era empregado em repartição dependente do Ministério da Guerra" e a mãe "alta, forte, cheia, como a filha, a mesma cabeça, os mesmos olhos claros". Jamais opuseram-se à amizade de Capitu e Bentinho.
• Padre Cabral, personagem que encontra a solução para o caso de Bentinho; se a mãe do menino sustentasse um outro, que quisesse ser padre, no Seminário, estaria cumprida a promessa.
• Escobar, amigo de Bentinho, seminarista, "era um rapaz esbelto, olhos claros, um pouco fugitivos, como as mãos, ... como tudo".
• Sancha, companheira de Colégio de Capitu, que mais tarde casa-se com Escobar.
• Ezequiel, filho de Capitu e Bentinho (Será ?). Tem o primeiro nome de Escobar (idéia de Bentinho, em colocar o mesmo). Vai para a Europa com a mãe, sendo que mais tarde, já moço, volta ao Brasil para rever o pai. Morre na Ásia.
Através das descrições que se faz das personagens, percebe-se um fato comum: os olhos, tão bem explorados por Machado de Assis, como nos exemplos "Olhos de cigana oblíqua e dissimulada", "olhos de ressaca", "olhos dorminhocos", "olhos redondos, que me acompanham para todos os lados". Na verdade, esses elementos físicos, muitas vezes, destacam o estado interior; tem-se um retrato íntimo das personagens. Em "olhos redondos" percebe-se uma característica física, mas, logo após, verifica-se um importante traço psicológico: "...que me acompanham para todos os lados"; que me observam, me estudam.
Quanto ao narrador, é homodiegético (aquele narrador que conta e participa da história) e, também, por se tratar do personagem principal, autodiegético. Já em relação ao narratário (o receptor do texto narrativo, a criatura ficcional ou não a quem se dirige o emissor-narrador), vê-se que é extradiegético mencionado, leitor virtual não ficcional. O personagem-narrador dialoga constantemente com os leitores: "Não me tenhas por sacrilégio, leitora minha devota, a limpeza da intenção...", "Por outro lado, leitor amigo, nota que eu queria...", "Sim, leitora castíssima, como diria o meu finado...".
Percebe-se claramente a fábula, conjunto de acontecimentos ligados entre si e narrados no decorrer da obra, e a trama, constituída pelos mesmos acontecimentos da fábula, mas caracterizada mais por um procedimento estético, em que o artista revolve com os fatos, não precisando se preocupar em seguir a ordem cronológica da fábula. Em Dom Casmurro, a narrativa encontra-se "in ultimas res", com a presença de analepses, quando o artista volta no tempo, no passado. A fábula é a história em si, a que o narrador quer nos contar, e a trama é o modo como ele nos narra a fábula; a ordem dos fatos na trama é diferente da ordem dos fatos na fábula.
A presença da metalinguagem
Segundo Roberto Melo MESQUITA, em Gramática da Língua Portuguesa (Editora Saraiva, 1ª edição, 1994, p.35.): "A linguagem tem função metalingüística quando discorre sobre o seu próprio conteúdo. É, na verdade, a própria linguagem que está em jogo. O emissor utiliza-se dela para transmitir ao receptor suas reflexões sobre ela mesma. O que ocorre em função metalingüística, é que o próprio código lingüístico é discutido e posto em destaque.".
Em Dom Casmurro, a narrativa discute o próprio ato e modo de narrar. Há, portanto, a função metalingüística, em que a narrativa esclarece a própria narrativa. Logo no início, nota-se a preocupação do personagem-narrador em explicar o título do livro e os motivos que o impulsionaram a confeccionar tal livro: "Também não achei melhor título para a minha narração; se não tiver outro daqui até ao fim do livro, vai este mesmo. O meu poeta do trem ficará sabendo que não lhe guardo rancor. E com pequeno esforço, sendo o título seu, poderá cuidar que a obra é sua. Há livros que apenas terão isso dos seus autores, alguns nem tanto." ou "Agora que expliquei o título, passo a escrever o livro. Antes disso, porém, digamos os motivos que me põem a pena na mão".
A questão do adultério
Não se sabe ao certo se houve ou não adultério por parte de Capitu e Escobar, já que o personagem-narrador apresenta, no decorrer da narrativa, vários indícios, provas e até contraprovas. Os leitores podem até pender para o lado de um (Bentinho) ou para o de outra (Capitu), entretanto a dúvida sobre o adultério permanece. Machado de Assis, talvez com a intenção de entregar ao leitor este difícil julgamento, foi brilhante ao estruturar sua obra com a apresentação tanto de provas quanto de contraprovas.
Primeiramente, atenta-se para a escolha de uma narrativa em primeira pessoa e, portanto, do personagem-narrador, o marido atormentado pela dúvida. Tudo o que se sabe é através de Bentinho, que narra os fatos; além da limitação, pois o leitor é informado apenas sobre o que o narrador conhece ou presencia, há também a possibilidade de Bentinho passar a sua visão das coisas, movido pelo ciúmes e pela imaginação. Desse modo, não se sabe o que é verdadeiramente concreto, real, dentro do romance, ou o que seja imaginado por Bentinho; dedução sua na observação dos fatos. Ele mesmo afirma "A imaginação foi a companheira de toda a minha existência ...".
O ciúme generalizado de Bentinho por Capitu toma espaço na narrativa, permitindo-se concluir que Dom Casmurro foi precipitado ao deduzir que Capitu amava Escobar. Desde o início, fica claro o ciúme: "Diante dessa fagulha, que bem podia ser uma maldade do agregado ou pura provocação, Bentinho se vê possuído de "um sentimento cruel e desconhecido, o puro ciúme". Ou ainda quando conversando com Capitu na janela, um jovem passa e olha para ela, que retribui o olhar. Já casados, o ciúme continua presente; Bentinho tem ciúme do mar, quando Capitu permanece com o olhar perdido no mar: "Venho explicar-te que tive tais ciúmes pelo que podia estar na cabeça de minha mulher, não fora ou acima dela".
O ciúme é tanto que chega a declarar, em determinado ponto da narrativa, que chegou a tê-lo "de tudo e de todos" e acrescenta "Um vizinho, um par de valsa, qualquer homem, qualquer moço ou maduro, me enchia de terror ou desconfiança".
Outras passagens já põem em evidência o clima de traição. É o caso do comentário feito a respeito da teoria do velho tenor italiano – "a vida é uma ópera" -, quando Bento afirma, que em sua ópera, ele cantou "um duo terníssimo, depois um trio, depois um quatuor..." como referência ao seu drama-ópera: o duo, composto de Bento e Capitu; o trio, Bento, Capitu e Escobar, o quatuor, quarteto formado por Bento, Capitu, Escobar e Ezequiel. Mesmo assim, cada vez que se apresenta uma prova, sugerindo o adultério, imediatamente lança-se uma contraprova.
Outra sugestão seria a citação, na narrativa, de um velha expressão do povo de que "O filho é a cara do pai". Como contraprova imediata e eficiente, surge a semelhança de Capitu com a mãe de Sancha, parecidíssimas sem qualquer grau deomenta: "Pouco antes de você chegar; eu não disse para que você não desconfiasse". Desconfiasse do quê? Certamente Capitu já conhecia o ciúme do marido e não queria provocá-lo. Na Segunda, então, Bento, ao voltar da estréia de uma ópera, encontra Escobar no corredor, de saída. Como desculpa, o amigo lhe apresenta um motivo jurídico importante que para Bento não era nada. Isso faz com que ele questione o porquê de Capitu não querer acompanhá-lo ao teatro, alegando estar adoecida e insistindo para que fosse sozinho. Quando chega em casa e se depara com Escobar, constata também que a esposa já "estava melhor e até boa".
Assim nada é esclarecido sobre o possível adultério, e o próprio Bentinho afirma: "Não é claro isto, mas nem tudo é claro na vida ou nos livros". Ele ainda atenta para que o leitor considere a sua "fraca memória"; confessa não ter boa memória e por esse motivo diz que "nada se emenda bem nos livros confusos, mas tudo se pode meter nos livros omissos". Ou seja, uma narrativa que apresenta falhas, lacunas a serem preenchidas pelo leitor.
Cabe, então, ao leitor esclarecer tal questão do adultério. O leitor, analisando todas as provas e contraprovas apresentadas, poderá opinar em favor do adultério ou contra ele, ou ainda permanecer na infinita dúvida.

Manual de Redação e Estilo - Os cem erros mais comuns

Erros gramaticais e ortográficos devem, por princípio, ser evitados. Alguns, no entanto, como ocorrem com maior freqüência, merecem atenção redobrada. O primeiro capítulo deste manual inclui explicações mais completas a respeito de cada um deles. Veja os cem mais comuns do idioma e use esta relação como um roteiro para fugir deles.


1 - "Mal cheiro", "mau-humorado". Mal opõe-se a bem e mau, a bom. Assim: mau cheiro (bom cheiro), mal-humorado (bem-humorado). Igualmente: mau humor, mal-intencionado, mau jeito, mal-estar.


2 - "Fazem" cinco anos. Fazer, quando exprime tempo, é impessoal: Faz cinco anos. / Fazia dois séculos. / Fez 15 dias.


3 - "Houveram" muitos acidentes. Haver, como existir, também é invariável: Houve muitos acidentes. / Havia muitas pessoas. / Deve haver muitos casos iguais.


4 - "Existe" muitas esperanças. Existir, bastar, faltar, restar e sobrar admitem normalmente o plural: Existem muitas esperanças. / Bastariam dois dias. / Faltavam poucas peças. / Restaram alguns objetos. / Sobravam idéias.


5 - Para "mim" fazer. Mim não faz, porque não pode ser sujeito. Assim: Para eu fazer, para eu dizer, para eu trazer.


6 - Entre "eu" e você. Depois de preposição, usa-se mim ou ti: Entre mim e você. / Entre eles e ti.


7 - "Há" dez anos "atrás". Há e atrás indicam passado na frase. Use apenas há dez anos ou dez anos atrás.


8 - "Entrar dentro". O certo: entrar em. Veja outras redundâncias: Sair fora ou para fora, elo de ligação, monopólio exclusivo, já não há mais, ganhar grátis, viúva do falecido.


9 - "Venda à prazo". Não existe crase antes de palavra masculina, a menos que esteja subentendida a palavra moda: Salto à (moda de) Luís XV. Nos demais casos: A salvo, a bordo, a pé, a esmo, a cavalo, a caráter.


10 - "Porque" você foi? Sempre que estiver clara ou implícita a palavra razão, use por que separado: Por que (razão) você foi? / Não sei por que (razão) ele faltou. / Explique por que razão você se atrasou. Porque é usado nas respostas: Ele se atrasou porque o trânsito estava congestionado.


11 - Vai assistir "o" jogo hoje. Assistir como presenciar exige a: Vai assistir ao jogo, à missa, à sessão. Outros verbos com a: A medida não agradou (desagradou) à população. / Eles obedeceram (desobedeceram) aos avisos. / Aspirava ao cargo de diretor. / Pagou ao amigo. / Respondeu à carta. / Sucedeu ao pai. / Visava aos estudantes.


12 - Preferia ir "do que" ficar. Prefere-se sempre uma coisa a outra: Preferia ir a ficar. É preferível segue a mesma norma: É preferível lutar a morrer sem glória.


13 - O resultado do jogo, não o abateu. Não se separa com vírgula o sujeito do predicado. Assim: O resultado do jogo não o abateu. Outro erro: O prefeito prometeu, novas denúncias. Não existe o sinal entre o predicado e o complemento: O prefeito prometeu novas denúncias.


14 - Não há regra sem "excessão". O certo é exceção. Veja outras grafias erradas e, entre parênteses, a forma correta: "paralizar" (paralisar), "beneficiente" (beneficente), "xuxu" (chuchu), "previlégio" (privilégio), "vultuoso" (vultoso), "cincoenta" (cinqüenta), "zuar" (zoar), "frustado" (frustrado), "calcáreo" (calcário), "advinhar" (adivinhar), "benvindo" (bem-vindo), "ascenção" (ascensão), "pixar" (pichar), "impecilho" (empecilho), "envólucro" (invólucro).


15 - Quebrou "o" óculos. Concordância no plural: os óculos, meus óculos. Da mesma forma: Meus parabéns, meus pêsames, seus ciúmes, nossas férias, felizes núpcias.


16 - Comprei "ele" para você. Eu, tu, ele, nós, vós e eles não podem ser objeto direto. Assim: Comprei-o para você. Também: Deixe-os sair, mandou-nos entrar, viu-a, mandou-me.


17 - Nunca "lhe" vi. Lhe substitui a ele, a eles, a você e a vocês e por isso não pode ser usado com objeto direto: Nunca o vi. / Não o convidei. / A mulher o deixou. / Ela o ama.


18 - "Aluga-se" casas. O verbo concorda com o sujeito: Alugam-se casas. / Fazem-se consertos. / É assim que se evitam acidentes. / Compram-se terrenos. / Procuram-se empregados.


19 - "Tratam-se" de. O verbo seguido de preposição não varia nesses casos: Trata-se dos melhores profissionais. / Precisa-se de empregados. / Apela-se para todos. / Conta-se com os amigos.


20 - Chegou "em" São Paulo. Verbos de movimento exigem a, e não em: Chegou a São Paulo. / Vai amanhã ao cinema. / Levou os filhos ao circo.


21 - Atraso implicará "em" punição. Implicar é direto no sentido de acarretar, pressupor: Atraso implicará punição. / Promoção implica responsabilidade.


22 - Vive "às custas" do pai. O certo: Vive à custa do pai. Use também em via de, e não "em vias de": Espécie em via de extinção. / Trabalho em via de conclusão.


23 - Todos somos "cidadões". O plural de cidadão é cidadãos. Veja outros: caracteres (de caráter), juniores, seniores, escrivães, tabeliães, gângsteres.


24 - O ingresso é "gratuíto". A pronúncia correta é gratúito, assim como circúito, intúito e fortúito (o acento não existe e só indica a letra tônica). Da mesma forma: flúido, condôr, recórde, aváro, ibéro, pólipo.


25 - A última "seção" de cinema. Seção significa divisão, repartição, e sessão equivale a tempo de uma reunião, função: Seção Eleitoral, Seção de Esportes, seção de brinquedos; sessão de cinema, sessão de pancadas, sessão do Congresso.


26 - Vendeu "uma" grama de ouro. Grama, peso, é palavra masculina: um grama de ouro, vitamina C de dois gramas. Femininas, por exemplo, são a agravante, a atenuante, a alface, a cal, etc.


27 - "Porisso". Duas palavras, por isso, como de repente e a partir de.


28 - Não viu "qualquer" risco. É nenhum, e não "qualquer", que se emprega depois de negativas: Não viu nenhum risco. / Ninguém lhe fez nenhum reparo. / Nunca promoveu nenhuma confusão.


29 - A feira "inicia" amanhã. Alguma coisa se inicia, se inaugura: A feira inicia-se (inaugura-se) amanhã.


30 - Soube que os homens "feriram-se". O que atrai o pronome: Soube que os homens se feriram. / A festa que se realizou... O mesmo ocorre com as negativas, as conjunções subordinativas e os advérbios: Não lhe diga nada. / Nenhum dos presentes se pronunciou. / Quando se falava no assunto... / Como as pessoas lhe haviam dito... / Aqui se faz, aqui se paga. / Depois o procuro.


31 - O peixe tem muito "espinho". Peixe tem espinha. Veja outras confusões desse tipo: O "fuzil" (fusível) queimou. / Casa "germinada" (geminada), "ciclo" (círculo) vicioso, "cabeçário" (cabeçalho).


32 - Não sabiam "aonde" ele estava. O certo: Não sabiam onde ele estava. Aonde se usa com verbos de movimento, apenas: Não sei aonde ele quer chegar. / Aonde vamos?


33 - "Obrigado", disse a moça. Obrigado concorda com a pessoa: "Obrigada", disse a moça. / Obrigado pela atenção. / Muito obrigados por tudo.


34 - O governo "interviu". Intervir conjuga-se como vir. Assim: O governo interveio. Da mesma forma: intervinha, intervim, interviemos, intervieram. Outros verbos derivados: entretinha, mantivesse, reteve, pressupusesse, predisse, conviesse, perfizera, entrevimos, condisser, etc.


35 - Ela era "meia" louca. Meio, advérbio, não varia: meio louca, meio esperta, meio amiga.


36 - "Fica" você comigo. Fica é imperativo do pronome tu. Para a 3.ª pessoa, o certo é fique: Fique você comigo. / Venha pra Caixa você também. / Chegue aqui.


37 - A questão não tem nada "haver" com você. A questão, na verdade, não tem nada a ver ou nada que ver. Da mesma forma: Tem tudo a ver com você.


38 - A corrida custa 5 "real". A moeda tem plural, e regular: A corrida custa 5 reais.


39 - Vou "emprestar" dele. Emprestar é ceder, e não tomar por empréstimo: Vou pegar o livro emprestado. Ou: Vou emprestar o livro (ceder) ao meu irmão. Repare nesta concordância: Pediu emprestadas duas malas.


40 - Foi "taxado" de ladrão. Tachar é que significa acusar de: Foi tachado de ladrão. / Foi tachado de leviano.


41 - Ele foi um dos que "chegou" antes. Um dos que faz a concordância no plural: Ele foi um dos que chegaram antes (dos que chegaram antes, ele foi um). / Era um dos que sempre vibravam com a vitória.


42 - "Cerca de 18" pessoas o saudaram. Cerca de indica arredondamento e não pode aparecer com números exatos: Cerca de 20 pessoas o saudaram.


43 - Ministro nega que "é" negligente. Negar que introduz subjuntivo, assim como embora e talvez: Ministro nega que seja negligente. / O jogador negou que tivesse cometido a falta. / Ele talvez o convide para a festa. / Embora tente negar, vai deixar a empresa.


44 - Tinha "chego" atrasado. "Chego" não existe. O certo: Tinha chegado atrasado.


45 - Tons "pastéis" predominam. Nome de cor, quando expresso por substantivo, não varia: Tons pastel, blusas rosa, gravatas cinza, camisas creme. No caso de adjetivo, o plural é o normal: Ternos azuis, canetas pretas, fitas amarelas.


46 - Lute pelo "meio-ambiente". Meio ambiente não tem hífen, nem hora extra, ponto de vista, mala direta, pronta entrega, etc. O sinal aparece, porém, em mão-de-obra, matéria-prima, infra-estrutura, primeira-dama, vale-refeição, meio-de-campo, etc.


47 - Queria namorar "com" o colega. O com não existe: Queria namorar o colega.


48 - O processo deu entrada "junto ao" STF. Processo dá entrada no STF. Igualmente: O jogador foi contratado do (e não "junto ao") Guarani. / Cresceu muito o prestígio do jornal entre os (e não "junto aos") leitores. / Era grande a sua dívida com o (e não "junto ao") banco. / A reclamação foi apresentada ao (e não "junto ao") Procon.


49 - As pessoas "esperavam-o". Quando o verbo termina em m, ão ou õe, os pronomes o, a, os e as tomam a forma no, na, nos e nas: As pessoas esperavam-no. / Dão-nos, convidam-na, põe-nos, impõem-nos.


50 - Vocês "fariam-lhe" um favor? Não se usa pronome átono (me, te, se, lhe, nos, vos, lhes) depois de futuro do presente, futuro do pretérito (antigo condicional) ou particípio. Assim: Vocês lhe fariam (ou far-lhe-iam) um favor? / Ele se imporá pelos conhecimentos (e nunca "imporá-se"). / Os amigos nos darão (e não "darão-nos") um presente. / Tendo-me formado (e nunca tendo "formado-me").


51 - Chegou "a" duas horas e partirá daqui "há" cinco minutos. Há indica passado e equivale a faz, enquanto a exprime distância ou tempo futuro (não pode ser substituído por faz): Chegou há (faz) duas horas e partirá daqui a (tempo futuro) cinco minutos. / O atirador estava a (distância) pouco menos de 12 metros. / Ele partiu há (faz) pouco menos de dez dias.


52 - Blusa "em" seda. Usa-se de, e não em, para definir o material de que alguma coisa é feita: Blusa de seda, casa de alvenaria, medalha de prata, estátua de madeira.


53 - A artista "deu à luz a" gêmeos. A expressão é dar à luz, apenas: A artista deu à luz quíntuplos. Também é errado dizer: Deu "a luz a" gêmeos.


54 - Estávamos "em" quatro à mesa. O em não existe: Estávamos quatro à mesa. / Éramos seis. / Ficamos cinco na sala.


55 - Sentou "na" mesa para comer. Sentar-se (ou sentar) em é sentar-se em cima de. Veja o certo: Sentou-se à mesa para comer. / Sentou ao piano, à máquina, ao computador.


56 - Ficou contente "por causa que" ninguém se feriu. Embora popular, a locução não existe. Use porque: Ficou contente porque ninguém se feriu.


57 - O time empatou "em" 2 a 2. A preposição é por: O time empatou por 2 a 2. Repare que ele ganha por e perde por. Da mesma forma: empate por.


58 - À medida "em" que a epidemia se espalhava... O certo é: À medida que a epidemia se espalhava... Existe ainda na medida em que (tendo em vista que): É preciso cumprir as leis, na medida em que elas existem.


59 - Não queria que "receiassem" a sua companhia. O i não existe: Não queria que receassem a sua companhia. Da mesma forma: passeemos, enfearam, ceaste, receeis (só existe i quando o acento cai no e que precede a terminação ear: receiem, passeias, enfeiam).


60 - Eles "tem" razão. No plural, têm é assim, com acento. Tem é a forma do singular. O mesmo ocorre com vem e vêm e põe e põem: Ele tem, eles têm; ele vem, eles vêm; ele põe, eles põem.


61 - A moça estava ali "há" muito tempo. Haver concorda com estava. Portanto: A moça estava ali havia (fazia) muito tempo. / Ele doara sangue ao filho havia (fazia) poucos meses. / Estava sem dormir havia (fazia) três meses. (O havia se impõe quando o verbo está no imperfeito e no mais-que-perfeito do indicativo.)


62 - Não "se o" diz. É errado juntar o se com os pronomes o, a, os e as. Assim, nunca use: Fazendo-se-os, não se o diz (não se diz isso), vê-se-a, etc.


63 - Acordos "políticos-partidários". Nos adjetivos compostos, só o último elemento varia: acordos político-partidários. Outros exemplos: Bandeiras verde-amarelas, medidas econômico-financeiras, partidos social-democratas.


64 - Fique "tranquilo". O u pronunciável depois de q e g e antes de e e i exige trema: Tranqüilo, conseqüência, lingüiça, agüentar, Birigüi.


65 - Andou por "todo" país. Todo o (ou a) é que significa inteiro: Andou por todo o país (pelo país inteiro). / Toda a tripulação (a tripulação inteira) foi demitida. Sem o, todo quer dizer cada, qualquer: Todo homem (cada homem) é mortal. / Toda nação (qualquer nação) tem inimigos.


66 - "Todos" amigos o elogiavam. No plural, todos exige os: Todos os amigos o elogiavam. / Era difícil apontar todas as contradições do texto.


67 - Favoreceu "ao" time da casa. Favorecer, nesse sentido, rejeita a: Favoreceu o time da casa. / A decisão favoreceu os jogadores.


68 - Ela "mesmo" arrumou a sala. Mesmo, quanto equivale a próprio, é variável: Ela mesma (própria) arrumou a sala. / As vítimas mesmas recorreram à polícia.


69 - Chamei-o e "o mesmo" não atendeu. Não se pode empregar o mesmo no lugar de pronome ou substantivo: Chamei-o e ele não atendeu. / Os funcionários públicos reuniram-se hoje: amanhã o país conhecerá a decisão dos servidores (e não "dos mesmos").


70 - Vou sair "essa" noite. É este que desiga o tempo no qual se está ou objeto próximo: Esta noite, esta semana (a semana em que se está), este dia, este jornal (o jornal que estou lendo), este século (o século 20).


71 - A temperatura chegou a 0 "graus". Zero indica singular sempre: Zero grau, zero-quilômetro, zero hora.


72 - A promoção veio "de encontro aos" seus desejos. Ao encontro de é que expressa uma situação favorável: A promoção veio ao encontro dos seus desejos. De encontro a significa condição contrária: A queda do nível dos salários foi de encontro às (foi contra) expectativas da categoria.


73 - Comeu frango "ao invés de" peixe. Em vez de indica substituição: Comeu frango em vez de peixe. Ao invés de significa apenas ao contrário: Ao invés de entrar, saiu.


74 - Se eu "ver" você por aí... O certo é: Se eu vir, revir, previr. Da mesma forma: Se eu vier (de vir), convier; se eu tiver (de ter), mantiver; se ele puser (de pôr), impuser; se ele fizer (de fazer), desfizer; se nós dissermos (de dizer), predissermos.


75 - Ele "intermedia" a negociação. Mediar e intermediar conjugam-se como odiar: Ele intermedeia (ou medeia) a negociação. Remediar, ansiar e incendiar também seguem essa norma: Remedeiam, que eles anseiem, incendeio.


76 - Ninguém se "adequa". Não existem as formas "adequa", "adeqüe", etc., mas apenas aquelas em que o acento cai no a ou o: adequaram, adequou, adequasse, etc.


77 - Evite que a bomba "expluda". Explodir só tem as pessoas em que depois do d vêm e e i: Explode, explodiram, etc. Portanto, não escreva nem fale "exploda" ou "expluda", substituindo essas formas por rebente, por exemplo. Precaver-se também não se conjuga em todas as pessoas. Assim, não existem as formas "precavejo", "precavês", "precavém", "precavenho", "precavenha", "precaveja", etc.


78 - Governo "reavê" confiança. Equivalente: Governo recupera confiança. Reaver segue haver, mas apenas nos casos em que este tem a letra v: Reavemos, reouve, reaverá, reouvesse. Por isso, não existem "reavejo", "reavê", etc.


79 - Disse o que "quiz". Não existe z, mas apenas s, nas pessoas de querer e pôr: Quis, quisesse, quiseram, quiséssemos; pôs, pus, pusesse, puseram, puséssemos.


80 - O homem "possue" muitos bens. O certo: O homem possui muitos bens. Verbos em uir só têm a terminação ui: Inclui, atribui, polui. Verbos em uar é que admitem ue: Continue, recue, atue, atenue.


81 - A tese "onde"... Onde só pode ser usado para lugar: A casa onde ele mora. / Veja o jardim onde as crianças brincam. Nos demais casos, use em que: A tese em que ele defende essa idéia. / O livro em que... / A faixa em que ele canta... / Na entrevista em que...


82 - Já "foi comunicado" da decisão. Uma decisão é comunicada, mas ninguém "é comunicado" de alguma coisa. Assim: Já foi informado (cientificado, avisado) da decisão. Outra forma errada: A diretoria "comunicou" os empregados da decisão. Opções corretas: A diretoria comunicou a decisão aos empregados. / A decisão foi comunicada aos empregados.


83 - Venha "por" a roupa. Pôr, verbo, tem acento diferencial: Venha pôr a roupa. O mesmo ocorre com pôde (passado): Não pôde vir. Veja outros: fôrma, pêlo e pêlos (cabelo, cabelos), pára (verbo parar), péla (bola ou verbo pelar), pélo (verbo pelar), pólo e pólos. Perderam o sinal, no entanto: Ele, toda, ovo, selo, almoço, etc.


84 - "Inflingiu" o regulamento. Infringir é que significa transgredir: Infringiu o regulamento. Infligir (e não "inflingir") significa impor: Infligiu séria punição ao réu.


85 - A modelo "pousou" o dia todo. Modelo posa (de pose). Quem pousa é ave, avião, viajante, etc. Não confunda também iminente (prestes a acontecer) com eminente (ilustre). Nem tráfico (contrabando) com tráfego (trânsito).


86 - Espero que "viagem" hoje. Viagem, com g, é o substantivo: Minha viagem. A forma verbal é viajem (de viajar): Espero que viajem hoje. Evite também "comprimentar" alguém: de cumprimento (saudação), só pode resultar cumprimentar. Comprimento é extensão. Igualmente: Comprido (extenso) e cumprido (concretizado).


87 - O pai "sequer" foi avisado. Sequer deve ser usado com negativa: O pai nem sequer foi avisado. / Não disse sequer o que pretendia. / Partiu sem sequer nos avisar.


88 - Comprou uma TV "a cores". Veja o correto: Comprou uma TV em cores (não se diz TV "a" preto e branco). Da mesma forma: Transmissão em cores, desenho em cores.


89 - "Causou-me" estranheza as palavras. Use o certo: Causaram-me estranheza as palavras. Cuidado, pois é comum o erro de concordância quando o verbo está antes do sujeito. Veja outro exemplo: Foram iniciadas esta noite as obras (e não "foi iniciado" esta noite as obras).


90 - A realidade das pessoas "podem" mudar. Cuidado: palavra próxima ao verbo não deve influir na concordância. Por isso : A realidade das pessoas pode mudar. / A troca de agressões entre os funcionários foi punida (e não "foram punidas").


91 - O fato passou "desapercebido". Na verdade, o fato passou despercebido, não foi notado. Desapercebido significa desprevenido.


92 - "Haja visto" seu empenho... A expressão é haja vista e não varia: Haja vista seu empenho. / Haja vista seus esforços. / Haja vista suas críticas.


93 - A moça "que ele gosta". Como se gosta de, o certo é: A moça de que ele gosta. Igualmente: O dinheiro de que dispõe, o filme a que assistiu (e não que assistiu), a prova de que participou, o amigo a que se referiu, etc.


94 - É hora "dele" chegar. Não se deve fazer a contração da preposição com artigo ou pronome, nos casos seguidos de infinitivo: É hora de ele chegar. / Apesar de o amigo tê-lo convidado... / Depois de esses fatos terem ocorrido...


95 - Vou "consigo". Consigo só tem valor reflexivo (pensou consigo mesmo) e não pode substituir com você, com o senhor. Portanto: Vou com você, vou com o senhor. Igualmente: Isto é para o senhor (e não "para si").


96 - Já "é" 8 horas. Horas e as demais palavras que definem tempo variam: Já são 8 horas. / Já é (e não "são") 1 hora, já é meio-dia, já é meia-noite.


97 - A festa começa às 8 "hrs.". As abreviaturas do sistema métrico decimal não têm plural nem ponto. Assim: 8 h, 2 km (e não "kms."), 5 m, 10 kg.


98 - "Dado" os índices das pesquisas... A concordância é normal: Dados os índices das pesquisas... / Dado o resultado... / Dadas as suas idéias...


99 - Ficou "sobre" a mira do assaltante. Sob é que significa debaixo de: Ficou sob a mira do assaltante. / Escondeu-se sob a cama. Sobre equivale a em cima de ou a respeito de: Estava sobre o telhado. / Falou sobre a inflação. E lembre-se: O animal ou o piano têm cauda e o doce, calda. Da mesma forma, alguém traz alguma coisa e alguém vai para trás.


100 - "Ao meu ver". Não existe artigo nessas expressões: A meu ver, a seu ver, a nosso ver.