Regência Verbal I


REGÊNCIA VERBAL

Regência verbal: é o nome da relação que se estabelece entre os verbos e os termos que os complementam (objetos diretos e objetos indiretos) ou caracterizam (adjuntos adverbiais). O estudo da regência analisa principalmente como é feita a relação entre o verbo regente e o complemento ou adjunto regido: dessa relação pode ou não participar uma preposição ou até mesmo uma conjunção (quando os complementos ou adjuntos assumem forma de oração subordinada); além disso, essa relação pode variar, produzindo modificações de significado. Outro dado a ser considerado nos estudos de regência verbal é a diferença entre o uso coloquial e o uso formal da língua.

1.1 VERBOS INTRANSITIVOS

Os verbos chegar e ir são normalmente acompanhados de adjuntos adverbiais de lugar. Na língua culta, as preposições usadas para indicar direção são a e para. A preposição em deve ser usada para indicações de tempo ou meio:

Chegamos a Salvador em meados de janeiro.
Fui ao cinema no domingo.
Cheguei a Manaus num velho barco.
Fomos para Brasília.

1.2 VERBOS TRANSITIVOS DIRETOS

São transitivos diretos, entre outros:

Abandonar / Abençoar / Aborrecer / Abraçar / Acompanhar / Acusar / Admirar / Adorar / Ajudar / Alegrar / Ameaçar / Amolar / Auxiliar / Castigar / Condenar / Conhecer / Conservar / Convidar / Defender / Eleger / Estimar / Humilhar / Namorar / Ouvir / Prejudicar / Prezar / Proteger / Respeitar / Socorrer / Suportar / Ver / Visitar

Na língua culta, o funcionamento desses verbos é idêntico ao do verbo amar:

Amo aquele homem./Amo-o.
Amo aquela mulher./Amo-a.
Amam aquele menino./Amam-no.
Ele vai amar aquela mulher./Ele vai amá-la.

Observação:

Os pronomes do caso oblíquo que atuam como objetos diretos são o, os, a, as, que podem assumir as formas lo, los, la, las (após formas verbais terminadas em -r, -s ou -z) ou no, nos, na, nas (após formas verbais terminadas em sons nasais). Não se devem usar como complementos dos verbos acima relacionados os pronomes lhe, lhes, que indicam objetos indiretos. Lhe, lhes só acompanham esses verbos para indicar posse (caso em que atuam como adjuntos adnominais):

Quero conhecer-lhe os hábitos. (= conhecer seus hábitos)
Prejudicaram-lhe a carreira. (= prejudicaram sua carreira)

1.3 VERBOS TRANSITIVOS INDIRETOS

São verbos transitivos indiretos, entre outros:

a) antipatizar e simpatizar, que têm complemento introduzido pela preposição com:

Antipatizo com aquele rapaz.
Simpatizo com os que defendem os sem-teto.

Observação:

Esses verbos não são pronominais. Não se deve dizer, portanto, "antipatizei-me com alguém" ou "simpatizei-me com alguém".

b) consistir, que tem complemento introduzido pela preposição em:

Desenvolvimento consiste em melhor padrão de vida para todos.

c) obedecer e desobedecer, que têm complemento introduzido pela preposição a:

Obedeço a velhos preceitos.
Não desobedeço a meus princípios.

Observação:

Apesar de transitivos indiretos, admitem a voz passiva analítica:

Sinais de trânsito devem ser obedecidos.
Leis não devem ser desobedecidas.

d) responder, que tem complemento introduzido pela preposição a:

Respondi a vários interessados.
Respondemos às questões propostas.

Observação:

Também admite voz passiva analítica, desde que o sujeito seja aquilo a que se responde:

Todas as perguntas foram respondidas satisfatoriamente.

1.4 VERBOS INDIFERENTEMENTE TRANSITIVOS DIRETOS OU INDIRETOS

Os verbos esquecer e lembrar, quando transitivos indiretos, são também pronominais:

Esqueci tudo./Esqueci-me de tudo.
Não esqueça seus amigos./Não se esqueça de seus amigos.
Não esquecemos nossa origem./Não nos esquecemos de nossa origem.
Não lembro nada./Não me lembro de nada.
Lembra que prometeste vir./Lembra-te de que prometeste vir.

Observações:

1. Esses verbos também apresentam uma outra possibilidade de construção, hoje restrita à língua literária:

Não me esquecem aqueles dias felizes. (= não me saem da memória)
Não me lembrou o dia dos teus anos. (= não me veio à lembrança)

2. Lembrar, no sentido de "advertir", "notar", "fazer recordar", usa-se com objeto indireto de pes­soa e objeto direto que indica a coisa a ser lembrada:

Lembrei aos meus amigos que estávamos atrasados.

1.5 VERBOS TRANSITIVOS DIRETOS E INDIRETOS

São transitivos diretos e indiretos:

a) agradecer, perdoar e pagar, que apresentam objeto direto de coisa e objeto indireto de pessoa:

Agradeci a ajuda a meu velho amigo.
Não perdoarei a dívida aos maus pagadores.
Pagamos as contas ao cobrador.

Observação:

O uso dos pronomes oblíquos átonos deve ser feito com particular cuidado:

Agradeci um favor./ Agradeci-o.
Agradeci a um velho amigo./ Agradeci-lhe.
Perdoei a ofensa./ Perdoei-a.
Perdoei a quem me ofendeu./ Perdoei-lhe.
Paguei minhas contas./ Paguei-as.
Paguei aos meus credores./ Paguei-lhes.

b) Informar, que apresenta objeto direto de coisa e objeto indireto de pessoa, ou vice-versa:

Informe os novos prazos aos alunos.
Informe os alunos dos novos prazos. (ou sobre os novos prazos)

Observação:

Quando se utilizam pronomes como complementos, podem-se obter as construções:

Informe-os aos interessados./ Informe-lhes os novos prazos
Informe-os dos novos prazos./ Informe-os deles. (ou sobre eles)

c) preferir, que na língua culta deve apresentar objeto indireto introduzido pela preposição a:

Prefiro doces a salgados.
Preferimos liberdade a privilégios.
Prefiro que me ajudes a que me aconselhes.

Observação:

Esse verbo, na língua culta, deve ser usado sem termos intensificadores como "muito", "antes", "mil vezes", "um milhão de vezes". Segundo os gramáticos que fazem essa observação, a ênfase já é dada pelo prefixo verbal.

1.6 VERBOS CUJA MUDANÇA DE TRANSITIVIDADE IMPLICA MUDANÇA DE SIGNIFICADO 

a) agradar

Quando transitivo direto, significa "fazer carinho", "acariciar":

Agradou a criança com alegria./Agradou-a com alegria.
Nunca o vejo agradar seu cão./Nunca o vejo agradá-lo.

Quando transitivo indireto, rege complemento introduzido pela preposição a e significa “causar agrado a”, “satisfazer a”, “ser agradável a”:

O candidato indicado pelo partido não agradou aos eleitores. O candidato indicado pelo partido não lhes agradou.

b) aspirar

Quando transitivo direto, significa "sorver inspirar", "inalar":

Há anos venho aspirando os poluentes destas indústrias. Há anos venho aspirando-os.

Quando transitivo indireto, rege complemento introduzido pela preposição a e significa “desejar”, “almejar” , “pretender”. Não se deve usar lhe ou lhes como objeto indireto desse verbo:

Ainda aspiro a um país melhor.
Ainda aspiro a ele.

c) assistir

Quando transitivo direto, significa "ajudar", "prestar assistência a":

O pediatra que está assistindo o menino é excelente.
O pediatra que o está assistindo é excelente.

Quando transitivo indireto, pode significar "ver", "presenciar", "estar presente a" ou "caber", "pertencer". Nos dois casos, rege complemento introduzido pela preposição a; no primeiro, apresenta objeto indireto de coisa; no segundo, de pessoa:

Assistiremos ao jogo decisivo./Assistiremos a ele.
Não assisti ás últimas sessões./Não assisti a elas.
Reclamar é um direito que assiste ao consumidor.
Reclamar é um direito que lhe assiste.

Também pode ser usado como transitivo indireto com o sentido de "ajudar", "prestar assistência":

Um novo geriatra vai assistir aos aposentados do bairro.
Um novo geriatra vai assistir-lhes.

Quando intransitivo, tem o sentido de "morar", "residir". É normalmente acompanhado de adjunto ad­verbial de lugar introduzido pela preposição em:

Assisti muitos anos naquela velha casa de fazenda.

d) chamar

Quando transitivo direto, significa "chamar", "solicitar a atenção ou a presença":

Por favor, vá chamar sua irmã.
Por favor, vá chamá-la.

significa "denominar", "tachar", "apelidar", pode ser transitivo direto ou transitivo indireto. Ao seu complemento se refere um predicativo do objeto que pode ser introduzido pela preposição de. Há diferentes possibilidades de construção:

Chamaram o vereador arrivista./Chamaram-no arrivista.
Chamaram ao vereador arrivista./Chamaram-lhe arrivista.
Chamaram o vereador de arrivista./Chamaram-no de arrivista.
Chamaram ao vereador de arrivista./Chamaram-lhe de arrivista.

e) custar

Quando intransitivo, significa “ter o valor de”, “ter o preço de”. Nesse caso, o verbo é acompanhado de um adjunto adverbial (que pode ser classificado como “de preço" ou 'de valor"):

Um nada daqueles está custando três milhões.
Os alimentos básicos não devem custar fortunas.

Quando transitivo indireto, significa "ser penoso", "ser difícil" e tem como sujeito urna oração subordinada substantiva reduzida:

Custa a um cidadão crer num absurdo desses.
Custou-nos perceber que estávamos sendo iludidos.
Custou-lhe ter que recomeçar.

f) implicar

Quando transitivo direto, significa "dar a entender", "pressupor" ou "trazer como conseqüência , acarretar", "provocar":

Sua obstinação implicava uma deliberada intenção de vencer.
Liberdade implica responsabilidade.
Observar direitos e deveres implica respeitar e ser respeitado.

Quando transitivo indireto, significa "embirrar", "ter implicância":

Implicas muito com tua sogra?

Quando transitivo direto e indireto, significa "envolver", "comprometer":

Acabaram implicando o ex-ministro em atividades criminosas.

g) proceder

Quando intransitivo, significa "ter cabimento", "ter fundamento" ou "portar-se", "comportar-se". Nessa segunda acepção, vem sempre acompanhado de adjunto adverbial de modo:

Suas desculpas por haver faltado não procedem. Sempre procedi com isenção.

Quando transitivo indireto, pode significar "originar-se", “provir” (sendo usado com a preposição de) ou "dar início", "realizar" (sendo usado com a preposição a):

Aquele carregamento de álcool procede do Paraná. Proceder-se-á aos trâmites legais necessários.

h) querer

Quando transitivo direto, significa "desejar", "ter vontade de", "cobiçar":

Queremos melhores condições de vida.
Vive querendo um carro novo.

Quando transitivo indireto, rege complemento introduzido pela preposição a e significa “ter afeição”, ''estimar'', “amar”:

Queremos muito aos nossos companheiros.
Quero-lhe muito.

i) visar

Quando transitivo direto, significa “mirar” , “apontar” ou “pôr visto em” , “rubricar”:

O caçador visava a cabeça do rinoceronte.
O gerente negou-se a visar esses documentos.

Quando transitivo indireto, rege complemento introduzido pela preposição a e significa “ter em vista”, “ter como objetivo”:

Essas medidas visam a melhoria do ensino público.
Os acordos visavam a uma solução para o problema.

Observação:

Na língua formal falada e escrita, não se deve atribuir a verbos de regências diferentes um mesmo complemento. Por isso, devem-se evitar construções como:

Entramos e saímos do trem várias vezes.
Assisti e gostei muito do filme.

Em seu lugar; devem ser usadas estruturas como:

Entramos no trem e saímos dele várias vezes.
Assisti ao filme e gostei muito dele.

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